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Entre a fala e a escrita: uma língua em quatro atos

Atualizado: 1 de nov. de 2018

Dominar razoavelmente uma língua não é tarefa fácil. Tanto mais difícil será se ela alcançar o status de idioma oficial de um país e o representar sócio-político-culturalmente. Para ter o domínio de uma língua, entre outros desafios, o falante deverá ser capaz de, com certo discernimento, compreender claramente o que lhe é dito oralmente, responder, com precisão e lógica, ao seu interlocutor quando abordado em uma interlocução de fala, além de desenvolver a capacidade de leitura e escrita de textos nos mais variados gêneros. Dito de outra forma, o bom falante é aquele capaz de ouvir, falar, ler e escrever com desenvoltura em qualquer língua nos múltiplos aspectos em que ela se apresenta.


Desenvolvemos as habilidades de ouvir e falar a partir dos primeiros anos de nossas vidas, e é no ambiente em que nos encontramos, em casa, entre amigos, no trabalho..., que tudo isso se dá.

Sem esse convívio doméstico e sociocultural de escutas e falas, dificilmente nos transformaríamos em falantes e ouvintes. Falamos porque, primeiramente, ouvimos os sons de nossa língua desde o agorinha em que nascemos e nos muitos momentos subsequentes, em conversas de botequins, em discussões calorosas entre amigos e familiares, em palavras melódicas embaladas por notas de uma canção ou em quaisquer outros ambientes interacionais de comunicação. E, ato contínuo, desejosos também de nos comunicar, atitude natural e essencial para o desenvolvimento de todo agrupamento sociocultural, acabamos por reproduzir esses mesmos sons em tons pronunciados pelos muitos falantes da língua de nossa pátria-mãe.


Desenvolvemos as habilidades de ouvir e falar a partir dos primeiros anos de nossas vidas

No entanto, o pontapé inicial para se aprender a ler e escrever raramente se dá no ambiente doméstico ou social. Na maioria dos casos, é preciso frequentar escolas para se adquirir esse saber formal. Papai e mamãe fazem isso logo que começamos a andar com as nossas próprias pernas. E essa aprendizagem também obedece a um ritmo interacional de comunicação semelhante àquele processo de aquisição da fala. São inúmeros os textos escritos que cruzam o nosso caminho diariamente: placas de trânsito, embalagens de produtos, letreiros propagandísticos, comerciais de TV.... Assim, os primeiros anos do ABC são dedicados quase que exclusivamente a ler e a escrever as primeiras sílabas e palavras dessa mesma língua que agora se encontra codificada e grafada. A todo esse processo inicial, damos o nome de alfabetização. Concomitantemente e por tempo consecutivo, por meio da leitura de textos diversos, de preferência aqueles produzidos por bons autores, acabamos por nos familiarizar com seus símbolos, códigos e estruturas expressivas. Quando isso acontece, segundo alguns especialistas da área educacional, vivenciamos o processo, conceito bastante questionável, do letramento, que poderá nos transformar, senhora e senhores, a depender do estreito diálogo que mantivermos com múltiplos e diferentes textos, em respeitáveis escritores.


Dito isso, é seguro afirmar que, entre aquela lição inaugural de audição - presente espontaneamente no exato momento em que nascemos e que se desdobra em milhares de tantas outras aprendizagens circunstanciais e recorrentes em nossas vidas - e a produção de uma escrita elegante e precisa, que se inicia nas primeiras horas dos bancos escolares e se sofistica no decurso mesmo de nossa existência, há um longo caminho a percorrer. No entremeio desses dois processos antagônicos, mas complementares, há a aprendizagem formal da gramática da língua (uma prática hoje bastante negligenciada em salas de aulas de todos os níveis de Ensino, inclusive o universitário), momento em que tomamos conhecimento mais especializados dos fatos que norteiam a língua.


Mas esse é um assunto para outro texto. Por ora, ficaremos por aqui. Se você, leitor, quer realmente aprender a escrever, reserve um tempo, por brevíssimo que seja, à leitura. Assim agindo, em breve descobrirá que, além de prazerosa, ela é o único caminho seguro a nos conduzir à escrita. Coragem, navegantes. Navegar por esses mares, apesar de suas curvas sinuosas, é preciso. Não há o que temer. Hasta la vista!

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