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Sarah Karenine: é preciso acreditar para transformar!

Atualizado: 2 de mai. de 2019

Entrevista com Sarah Karenine, coordenadora pedagógica do Núcleo Gestor de Educação Integral (NGETI) para o Dozé | Por Heriberto de Souza

Sarah Karenine: elegância em pensamento e gesto
Sarah Karenine: coordenadora pedagógica do Núcleo Gestor de Educação Integral (NGETI). Foto: Eugênio Barreto

A Secretaria de Estado da Educação, do Esporte e da Cultura (SEDUC), sob a coordenação pedagógica do Núcleo Gestor de Educação Integral (NGETI), em parceria com Instituto Qualidade no Ensino (IQE), de Pernambuco, nos dias 15, 16 e 17 de abril realizou mais um curso de formação continuada para os professores das 41 escolas que aderiram ao Programa Estadual de Ensino Integral Escola Educa Mais. Segundo a coordenadora pedagógica do NGETI, professora Sarah Karenine, em matéria publicada no site da própria Secretaria, o primeiro dia de formação destinou-se a gestores e coordenadores pedagógicos das escolas de tempo integral com fins de ajustar o Plano de Ação da SEDUC às ações das escolas que participam do Programa Educa Mais e ao monitoramento da aplicação desse instrumental de gestão. Nos dias subsequentes, a formação continuada trabalhou com os professores de matemática e língua portuguesa a aplicação das SDs (Sequências Didáticas), recurso pedagógico para o desenvolvimento de habilidades niveladoras visando equiparar os conteúdos estudados.


Entre breaks e coffee breaks, papeamos com a professora Sarah Karenine, que gentilmente nos concedeu uma entrevista exclusiva, a primeira a ser postada no Dozé, inaugurando assim a sessão “Entrevistas” no Blog do site do Centro de Excelência Professor José Carlos de Sousa. A conversa que tivemos – marcada por uma fala inteligente, pautada pela firmeza serena de quem sabe o que diz e o que faz, elegante em pensamento e gestos – causou-nos singular impressão. Apesar de breve, a entrevista, que foi gravada em áudio, traz informações e reflexões importantes acerca dos desafios do Ensino Integral em Sergipe. Ao término, Sarah Karenine revela parte da agenda de compromissos educacionais do Núcleo Gestor das Escolas em Tempo Integral (NGETI) para o Ensino Integral em 2019. Confiram, gostem, desgostem, mas não deixem de fazer seus comentários abaixo.


Professor Heriberto de Souza apresentando o site do "Zé Carlos" a Sarah Karenine e professoras


 

Quais os principais desafios pedagógicos enfrentados pela Escola Integral em Sergipe?


Os desafios pedagógicos do Integral em Sergipe são inúmeros e estão estreitamente ligados aos da Educação como um todo. Viajando pelo Brasil, ao falar um pouco de nossa experiencia aqui, as pessoas não compreendem como um estado com a nossa dimensão geográfica está imerso em índices tão ruins, em índices tão difíceis, porque a barreira geográfica é forte em outros estados, como, por exemplo, o da Bahia que para uma Secretaria fazer um acompanhamento de uma determinada escola, ela acaba tendo que percorrer muitos quilômetros, às vezes dias de viagem para chegar até lá. Já aqui em Sergipe, em um dia nós cruzamos todo o Estado.


Eu diria que um dos nossos maiores desafios está relacionado à continuidade dos processos pedagógicos. As mudanças políticas zeram, senão todos eles, alguns desses importantes processos. Elas resetam, estartam processos educacionais o tempo todo, e a gente acaba não tendo tempo para colher os frutos daquilo que foi plantado.

Diria ainda que muito dos nossos desafios se assemelham aos desafios da Educação enquanto rede. Sergipe tem índices ainda muito duros, muito difíceis nas avaliações externas no que diz respeito ao nosso processo de aprendizagem... Então, nós temos uma grande evasão, uma grande reprovação. Nosso Ideb (Índice de Desenvolvimento da Educação Básica) mostra que o nosso fluxo é comprometido.... Nosso estudante não migra, não é aprovado, não passa do primeiro para o segundo..., para o terceiro (ano). A gente tem um problema de fluxo sério: a cada 100 estudantes que chegam ao primeiro ano somente sessenta passam para o segundo ano, e aí esse número vai se reduzindo..., então a gente tem uma conclusão do Ensino Médio baixíssima ao final do terceiro ano...


O Integral vem cheio de propostas, né?!, de modificar isso..., uma proposta de gestão diferenciada, uma gestão voltada para o resultado, de eficiência. Propõe, por exemplo, que o diretor escolar trabalhe mais o pedagógico; que ele apoie mais a rotina pedagógica, estimule o protagonismo juvenil... A título de ilustração, a gente traz como proposta a criação e implementação de coordenadorias administrativas e fiscais no âmbito de cada uma das unidades de ensino que trabalham com o Integral. Essas coordenadorias, popularmente conhecidas por CAF, têm por objetivo, entre outros, assumir a parte mais administrativa e burocrática da escola, deixando esse gestor mais livre...

É evidente que nenhuma proposta em particular irá resolver pontualmente todos os nossos problemas. É preciso criar um conjunto de ações capaz de dar conta de todas as nossas demandas educacionais. Por isso que o Integral movimenta muitos setores, entende?!, traz uma proposta de tecnologia de gestão educacional e um modelo pedagógico diferenciado.... E mesmo pensando e agindo assim ainda há vários entraves que atingem diretamente o pedagógico, como os problemas na alimentação. Quando, por razões diversas, a merenda não pode ser servida, a escola se vê obrigada a liberar mais cedo os estudantes, privando-os temporariamente da integralidade dos estudos e, por conseguinte, afetando o desempenho acadêmico.


Mas eu vejo que o principal (problema) - focando hoje o Integral já implementado nas escolas - do pedagógico é sistematizar e gerir a rotina dentro do ambiente escolar. Num dado momento, concluímos que era preciso fazer com que o professor voltasse a se apaixonar pela Educação, como acontecia anteriormente...

Nós, quando apresentamos às escolas o processo (de implantação e funcionamento do Integral), enfrentamos muitas dificuldades para fazer com que esses professores voltassem a acreditar, voltassem a sonhar, e muitos vieram conosco, muitos não. Hoje, ao contrário do que ocorreu no passado, a situação é bem diferente, melhorou bastante. Agora eles acreditam em nossa proposta, vestiram a camisa, começaram a sonhar conosco. Lembro-me de quando éramos fortemente acusados de tentar implantar um modelo novo de escola sem nenhuma infraestrutura para tal fim. Em resposta, batíamos sempre na tecla de que olha, não adianta uma infraestrutura maravilhosa se a escola não tem uma alma, se a escola não tem pessoas envolvidas em um propósito comum.


Vencemos todos esses desafios iniciais por meio de planejamento e ações. A Secretaria tem um plano de ação que, em consonância com os planos de ação das escolas, busca alinhar estratégias com fins de cumprir metas que nos são comuns. Ninguém vai a lugar algum se todos não estiverem buscando os mesmos propósitos. Então eu penso que a dificuldade mesmo do pedagógico é unir todos os professores e estudantes em torno de um único propósito: apoiar esse aluno na realização de seu sonho, de seu projeto de vida.

E para isso, como é que a gente articula? – Articulando toda uma parte flexível do currículo e todo o BNCC (Base Nacional Comum Curricular), as metodologias de êxitos, a pedagogia da presença, os clubes, estudos orientados, as Eletivas, práticas experimentais... Enfim, a gente articula uma série de elementos para fazer com que esse estudante tenha êxito na sua trajetória de vida. Então eu penso que o primeiro dos grandes desafios foi fazer todos voltarem a sonhar e acreditar nesse potencial, e o segundo, gerir essa rotina de forma eficiente através de ciclos de acompanhamento em que a gente possa acompanhar a escola, cobrar, sem descuidar de dar suporte.


Por esses dias, realizamos formações para processos de nivelamento em português e matemática. Há anos que o Estado não consegue fazer formação continuada, que é importantíssima nesse processo de levar qualidade para a escola. A gente não pode cobrar dos professores se não lhes oferecer condições de desenvolver um bom trabalho. Na hora que dou a formação para o processo de nivelamento, na hora que dou o suporte, eu posso acompanhar, monitorar e exigir. E aí a gente faz um alinhamento enquanto rede, e já conseguimos resultados fantásticos: redução da reprovação e da evasão, aumento da aprovação; em tão pouco tempo já se tem modificado muito a realidade dessas escolas.


Este é o desafio: fazer com que todos comecemos a olhar realmente para o processo de aprendizagem, não de conteúdo; não basta ministrar o conteúdo, é preciso saber e garantir que esse menino esteja aprendendo. É preciso trabalhar com áreas de conhecimento. É preciso estar alinhado a novas diretrizes. É preciso ter um sonho em comum. É preciso que todo mundo..., todos..., da merendeira ao professor, do estudante ao gestor, trabalhem para atingir essas metas, que elas repercutam na vida de todos. Esse é um grande desafio do programa e um desafio imenso do pedagógico.

O que está sendo feito para superar esses desafios?


Para superar esses desafios é preciso não só ações pontuais. As nossas mudanças políticas, conforme já disse, elas resetam ações, resetam projetos bacanas e a gente reinicia então o tempo todo. Reinventamos a roda.

Os projetos que estão aí são todos muito bons, maravilhosos. O próprio Integral não traz novidades. Traz um conjunto de coisas que já acontecia em várias escolas, só que isoladamente. Acontecia um sistema de monitoramento de aprendizagem em uma escola; em outra, aconteciam projetos que a gente pode chamar hoje de eletivas...

O integral, o que é que ele faz? – Ele traz tudo isso para dentro de uma única escola, dá condições para que essa escola atue. Então ele vincula o quadro docente a uma mesma unidade de ensino, amplia a jornada do professor, amplia a permanência do estudante, gratifica o professor, tem um plano de ação alinhado... São muitas as estratégias e mecanismos que a gente utiliza para tentar vencer essas adversidades. Não se muda a Educação de uma hora para outra, é um processo longo, e várias frentes precisam ser movimentadas.


Não adianta ampliar a carga de permanência do professor na escola se eu não tenho um projeto estruturado para que ele trabalhe. Não adiante ter um projeto estruturado para que ele trabalhe se eu não o formo para trabalhar naquele projeto; não adianta formá-lo para trabalhar naquele projeto se eu não faço o devido acompanhamento.

É uma grande e complexa engrenagem que precisa se firmar e se apresentar maior do que as políticas locais. Precisa ser realmente um plano de Estado e não de governo. A sociedade realmente precisa abraçar e apoiar, porque o Integral ainda está em processo de implementação, então a gente ainda não tem robustez. Os resultados, no entanto, já mostram grandes mudanças, e muitas delas ainda não estão aparecendo nos índices (educacionais), nos números. São mudanças que estão no coração, no espírito, na alma dessas crianças que antes saiam da escola e agora é preciso o gestor dizer gente, tá na hora de ir embora, porque eles não querem sair da escola. Verdadeiras famílias estão se formando dentro do ambiente escolar, e isso as pessoas precisam falar, elas precisam dizer, os pais, os professores precisam dizer... Todos precisam falar um pouco sobre as mudanças que estão acontecendo em suas vidas. Isso é coisa que, vamos dizer..., não sai nos números, mas que transforma sobretudo com o passar do tempo.


Qual é a agenda de cursos e formações continuadas para 2019?


Em 2017, aconteceram inúmeras formações que se prolongaram até 2018. Para 2019, há 14 formações previstas. Algumas delas já estão criando certa história dentro do programa, a exemplo da formação inicial que, em sua primeira, segunda e terceira edições, formou, respectivamente, em torno de seiscentos, quinhentos e trezentos novos professores para atuar nas escolas de tempo integral.


Nossa adesão é gradual. Agora elas (as formações) estão indo para o seu terceiro ano de implementação nas escolas da Primeira Portaria. Para as escolas de Segunda Portaria, a gente está ainda no segundo ano de implementação. Essas capacitações compõem um quadro de formações trazido pelos parceiros que nos ajudam no processo de implementação - o STEM Brasil, parceria para trabalhar a formação nas disciplinas de práticas experimentais nas áreas das ciências (matemática, física, química e biologia); o Instituto Qualidade no Ensino – IQE, parceria para trabalhar o nivelamento de habilidades em Português e Matemática e o Instituto de Corresponsabilidade pela Educação - ICE, parceria para a implantação do modelo pedagógico e de gestão - Há ainda a seguintes formações a serem realizadas: Projeto de Vida (PV), Medição e Maturidade de Processos (MMP), destinado a equipes gestoras, Instrumentos de Gestão (IG) entre tantos outras.


Elas são muitas. Este ano, a gente está focando mais fortemente nas equipes gestoras. Sentimos que nossos gestores não estão preparados para trabalhar com planejamento, com plano de ação, com tecnologia de gestão. Então vamos focar no fortalecimento da compreensão do gestor diante desse programa.

O ICE, um dos nosso mais importantes parceiros, estará nos deixando este ano, após ter cumprido um cronograma de ações previamente definido para o Integral de Sergipe. É uma saída antecipadamente estabelecida, programada. Quando isso se der, a nossa agenda de compromissos envolvendo o ICE folgará um pouco mais, e a partir de então voltaremos nosso atenções para as áreas de conhecimento ligadas à BNCC (Base Nacional Comum Curricular). Essa medida se faz necessária porque é preciso preparar nossos professores para a reforma do Ensino Médio, que irá trabalhar justamente o fortalecimento dessas áreas.


Para o segundo semestre, além dos ciclos de formação continuada e de acompanhamento de gestores e professores já mencionados, destaco três ações que julgo importantes para o bom andamento dos trabalhos no Integral: a realização do Educa Mais Café, um evento de periodicidade anual voltado para a troca de experiências e partilha de boas práticas educativas; uma formação continuada na área de Projeto de Vida, para que os professores possam, de maneira segura, consciente, dar suporte ao aluno nesta etapa importante de sua formação, e a Semana do Protagonismo nas Escolas, para a criação dos clubes estudantis. O movimento é intenso. Às vezes, nem todos os professores sentem, mas estamos movimentando quarenta e uma escolas nas dez (diretorias) regionais de educação.


O movimento é esse, professor, de transformação. Sergipe está engatinhando ainda, mas tem muito potencial, nossa geografia nos ajuda, nos favorece, basta apenas que a gente esteja unido num propósito de mudança da Educação e que tenhamos o apoio sempre dos gestores que assumem as pasta da Educação, de governadores, de prefeitos, de vereadores, que isso realmente seja uma bandeira de todos. Parte desse nosso sucesso se deve, evidentemente, a atual gestão, que nos incentiva na propagação dessas boas práticas pedagógicas trazidas pelo Integral para toda a nossa rede. Esse apoio, certamente, pode ser traduzido como um reconhecimento de nossas ações, um indicador de que estamos no caminho certo. É isso. Um grande abraço.
 

Alguns momentos do último dia da formação continuada em Aracaju


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